Havia algo de irreal no ar de Atlantic City naquele dia. O Taj Mahal Hotel and Casino, novo símbolo da ambição desmedida de Donald Trump, fervia sob o peso das câmeras, dos curiosos e da aura de riqueza artificialmente dourada. Mas nada – absolutamente nada – preparou aquele repórter para o que viria a seguir. Alex Connock, jovem jornalista britânico, se viu inesperadamente no centro de um furacão midiático quando Michael Jackson, em carne e osso, cruzou os portões do império de Trump.

Não era uma entrada calculada. Era um fenômeno. Como se Elvis tivesse ressuscitado e entrado voando pelas janelas do cassino. Trump, com sua habilidade instintiva para o espetáculo, agarrou Michael pelo braço e o arrastou triunfalmente pelo saguão tomado por uma multidão que parecia ter emergido do chão. A recepção virou palco. A escada rolante, um desfile. E o salão de jogos – imenso como um estádio – se tornou um templo em frenesi. Connock, atônito, descreve o momento como uma tempestade de areia emocional. “Refugiámo-nos num restaurante chinês”, lembrou ele, “como soldados em meio à batalha”.

Mas o espetáculo ainda estava longe de acabar. No dia seguinte, Trump ligou. Um convite: “Quer vir comigo e com Michael em um voo privado?” O repórter não hesitou. Em minutos, estava a bordo de um jato luxuoso, oferecido por ninguém menos que Akio Morita, o cofundador da Sony, amigo íntimo de Jackson.

O destino: Indianápolis. O motivo, revelado apenas ao desembarcarem, era comovente demais para qualquer roteiro de Hollywood.

Ryan White havia morrido. O garoto que comoveu os Estados Unidos ao enfrentar a AIDS com coragem e dignidade era um símbolo de pureza e injustiça. Michael Jackson, que já o visitara em vida, sentia uma dor real. “Ele precisava estar ali”, contou Connock. A viagem, antes envolta em glamour, assumiu um tom sombrio e reverente. A estrela que tantas vezes fora vista como inatingível, estava ali, silenciosa, humilde, prestando tributo à memória de um amigo.

Esse contraste – do caos de Atlantic City ao silêncio de Indianápolis – resumiu muito do que era Michael Jackson. Ídolo global, sim. Mas, acima de tudo, humano. Trump, por sua vez, parecia compreender a grandiosidade do momento, mas nunca deixou de observar tudo como um produtor observa seu show. E Connock, entre os dois titãs, flutuava com sua caneta, registrando a história sem saber que ela viraria lenda.

Hoje, décadas depois, o episódio parece um delírio cinematográfico. Um cruzamento improvável entre egos, emoções e eras. E talvez seja isso que torna o jornalismo algo mágico: a capacidade de capturar um instante tão único, tão carregado de significado, que ecoa muito além das páginas em que foi impresso. Bons, e velhos tempos, como diria o próprio Connock. E que tempos!

One Comment

  1. É impressionante como a história é surpreendente. Décadas atrás uma pessoa de senso tão humanitário como Michael Jackson, que pregava a igualdade entre os povos de todas as origens se encontrou com uma figura tão desumana e desprezível como Donald Trump que agora de volta ao governo americano insiste em cometer atrocidades como deportação de latinos, com claras pretensões de dominar o mundo. Se o Michael tivesse vivido para ver esse individuo presidente, daria depoimentos sobre esse encontro se mostrando arrependido, pois ele através das canções propagava um mundo melhor.

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