Sob a Janela de Michael Jackson: Uma memória em Paris, 1997

Sob a Janela de Michael Jackson: Uma memória em Paris, 1997

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”Eu nunca tinha visto essa foto antes. Uma imagem que me pegou de surpresa, como o cheiro de infância em um lugar esquecido. Nela, há uma mistura agridoce que escapa à definição – talvez porque contenha mais do que pixels: ela contém uma ausência. Não digo que fui íntimo de Michael Jackson, nem seu confidente, mas havia algo de genuíno e silencioso entre nós. Algo que não pedia explicações.

Desde nossos primeiros encontros, havia um ponto de conexão improvável: a Disney. Ele com seu fascínio pelos Imagineers, eu com meu pedido de casamento feito lá, entre fogos e castelos. Contávamos histórias sobre o parque como dois garotos crescidos que haviam descoberto que a magia nem sempre precisa acabar. Éramos diferentes, claro – ele era Michael – mas a ponte construída por esse amor compartilhado parecia inabalável.

O curioso é que nunca tentei impressioná-lo. Talvez por isso tenhamos nos dado tão bem. Com Michael, bastava estar. Havia uma tranquilidade nos nossos encontros, como se o silêncio entre uma piada e outra dissesse mais do que mil palavras. Ríamos juntos, mas o riso era o subproduto de uma leveza rara entre dois mundos diferentes que se tocavam, de vez em quando, com delicadeza.

Michael tinha uma vida orbitada por compromissos, flashes e expectativas. Mesmo assim, ele abriu espaço para mim – e não porque precisava, mas porque queria. Nossa amizade não exigia nada. Era confortável como uma poltrona antiga, sem pressão para ser mais do que já era. Eu sabia que podia contar com ele, e ele sabia o mesmo de mim. É o tipo de relação que você não anuncia, mas sente falta quando o telefone deixa de tocar.

Não tenho objetos para lembrar dele. Nenhuma luva, nenhum chapéu. Só algumas fotos que guardo com carinho e uma cesta maravilhosa que ele mandou quando minhas filhas nasceram. Nosso afeto não precisava de souvenires – ele se manifestava nas entrelinhas, no simples gesto de dividir doces no estúdio, ou pipoca num momento qualquer.

Mas tem algo que sempre me transporta: o hotel da Disney Paris. Só de olhar para ele, sou levado de volta. Estávamos na França por outro motivo, longe de qualquer conexão com Michael, mas o destino – ou algo assim – tratou de juntar nossos caminhos de novo. Uma ligação para Brad Buxer, e de repente tínhamos ingressos para o show da turnê HIStory e um convite inesperado vindo do escritório de Michael.

Saltamos no trem cedo naquela manhã sem saber o que esperar. No saguão do hotel, fomos recebidos por um membro do elenco e escoltados até uma sala de jantar privada. Um banquete nos aguardava. E depois, Brian – o guia que faria aquele dia parecer um sonho vívido. A cada atração, a cada desvio pelas zonas restritas, eu sentia que algo maior nos acompanhava. O frio do dia não importava. Michael, discretamente, estava cuidando de nós.

Quando a noite caiu, exaustos e sorrindo, entendemos o que aquele gesto significava. Nós não éramos celebridades, nem nomes influentes. Éramos apenas pessoas que ele considerava. Michael não apareceu naquele dia, mas sua presença estava em cada detalhe. Talvez ele quisesse estar ali, talvez tenha acenado por trás da cortina – como diziam alguns que apontavam para a janela da suíte acima de nós.

Anos depois, ainda discutíamos Disney. Falávamos sobre excelência, sobre como as pequenas coisas importam. Ele perseguia a perfeição em sua arte como poucos. E talvez tenha visto em mim, em meu trabalho com som e atmosfera, essa mesma busca – ainda que em outra escala. Eu o admirava por isso, mas mais ainda pelo que fazia longe dos holofotes.

Lembro das reuniões no carrinho de golfe do Batman, das conversas em horários estranhos, das ideias que flutuavam entre nós. Não era a fama dele que me encantava – era a humanidade. O modo como ele escutava, o cuidado com minha família. Quando vejo aquela foto agora, sinto falta da sua sombra, da sua risada fora de ritmo, dos silêncios que compartilhamos.

Michael foi muitas coisas para o mundo. Para mim, foi alguém que me viu, sem necessidade de legendas. E por isso, sou grato.”

Relato de Brad Sundberg, profissional em sistemas de som que trabalhou ao lado do Rei do Pop.


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