Por: Brad Sundberg, diretor técnico de Michael Jackson por 18 anos
Não sei você, mas às vezes me pego pensando naqueles pequenos momentos que mudam tudo. As bifurcações invisíveis da vida. Aqueles dias em que você podia virar à esquerda ou à direita — não literalmente, mas nas escolhas que faz.
Décadas atrás, eu poderia ter continuado na UPS e me tornado motorista de entregas. Provavelmente estaria hoje perto de uma aposentadoria confortável… e talvez com alguns joelhos operados. Sem desrespeito aos motoristas — vocês ralam demais.
Mas decidi seguir outro caminho. Fui para Hollywood tentar a sorte como engenheiro de som. Depois de algumas outras encruzilhadas, acabei, por pura providência divina, conectando-me a Michael Jackson.
Eu gostava de algumas músicas dele, mas sinceramente, não me considerava fã. Estava lá para fazer meu trabalho. Mas por razões que até hoje não consigo explicar direito, ele confiou em mim — e nos tornamos amigos.
E não falo de uma amizade superficial. Falo de horas de conversa sobre tudo:
Música. Disney. Feiras estaduais. Comida. Família. Roupas. Pegadinhas. Brinquedos.
É curioso, porque apesar da imagem distante que muitos tinham dele, Michael era incrivelmente falante e curioso.
Uma das minhas filhas se define como “tagarela”. E por mais estranho que possa parecer, Michael também era um pouco tagarela às vezes. Ele amava contar histórias, e adorava ouvir também. E como tudo isso aconteceu antes da febre dos celulares e redes sociais, conversar era essencial.
Durante a produção de Captain EO, contei a ele que eu e minha esposa Debbie tínhamos passe anual da Disneyland. Passávamos muitos domingos lá, jantando, andando nos brinquedos, só curtindo. Michael adorava ouvir isso. E, de certa forma, acho que ele invejava essa liberdade simples — de estar em um parque sem disfarces, sem segurança, sem atenção excessiva.
Nossas segundas-feiras muitas vezes lembravam o papo entre colegas de escola:
“E aí, como foi o fim de semana?”
Trocávamos piadas bobas, zoeiras leves. A camaradagem era sincera, quase infantil — e maravilhosa.
Talvez para muita gente isso soe imaturo. Jogar balas um no outro, rir de montanha-russa e falar sobre brinquedos? Mas a verdade é que nunca me imaginei vestindo gravata e falando de ações na Bolsa.
Com o tempo, ele foi me chamando para mais e mais projetos. Não porque eu fosse o melhor técnico do mundo — e eu realmente não acho que sou — mas porque ele confiava em mim. E acho que ele gostava da minha companhia.

Trabalhei nos álbuns Bad, Dangerous e HIStory. Três palavras que, engraçado pensar, resumem quase dez anos da minha vida.
Trabalhei ao lado de Bruce Swedien, engenheiro principal de Michael, em Moonwalker, em mixes de dança, vídeos e incontáveis gravações. Até que, em 1987, Michael comprou seu famoso rancho — o que viria a ser Neverland.
Ele me puxou de lado no estúdio e perguntou:
“Você me ajudaria a colocar música no rancho?”
“Tipo… onde exatamente?”
“Bem… estou comprando um trem. Quero música no trem. Você consegue fazer isso?”
Esse foi um daqueles momentos decisivos. Olhei pra ele e disse:
“Claro. Acho que conseguimos descobrir como colocar música num trem.”
E assim foi. Ano após ano, projeto após projeto, Michael me chamava e perguntava: “Você pode me ajudar com isso também?”
Vi ele se apresentar no Madison Square Garden durante a Bad Tour. Vi minha filha Amanda, ainda menina, subir ao palco com ele em Paris para cantar Heal The World na HIStory Tour. Mas, sinceramente? Não foram esses momentos gigantescos que me marcaram mais.
O que ficou mesmo foram os gestos pequenos. A amizade real. Michael foi bom comigo. Foi bom com minha família. Ele era, acima de tudo, uma alma genuína.
Amigos assim são raros. Aqueles com quem você se entende com um olhar. Quando ele me olhava e eu entendia o que ele queria dizer sem uma palavra… isso era ouro.
Foram quase 20 anos de convivência. E não sei se orgulho é a palavra certa. Talvez seja “gratidão”. Ou “celebração”. Ou apenas “memória boa”.
Penso em Michael com frequência. Se quiser a verdade, penso nele quase todos os dias. Claro, sinto falta dos álbuns, dos shows, de construir Neverland. Mas mais do que tudo, sinto falta de ouvir o telefone tocar às duas da manhã… e minha esposa dizendo, meio sonolenta:
“É o Michael…”
“Oi Brad, te acordei?”
“Não, Michael… não me acordou. O que você precisa?”