Michael Jackson e Marting Bashir na sequêcia final para o documentário "Living with Michael Jackson".

Os Tolos e os Conformados

Por Andréa Luisa Bucchile Faggion;
Originalmente publicado na coluna “Amém”, Edcyhis (Fevereiro de 2003);
Republicação adaptada pela MJ Beats.


Os fãs de Michael Jackson podem ser divididos em três grupos.

O primeiro grupo é composto pelos fanáticos que patrulham fóruns e comunidades, acreditando que cabe a eles decidir quem é — ou não — um verdadeiro fã.
Para esses, um “fã de verdade” seria alguém incapaz de escrever qualquer comentário remotamente negativo sobre Michael.
Muitas vezes, criticam até mesmo a publicação de notícias que possam soar desfavoráveis.

O segundo grupo inclui aqueles que já não aprovam quase nada do que Michael faz — ou há muito tempo deixaram de admirar algo nele — mas permanecem na comunidade por puro prazer em provocar e criticar cada gesto ou palavra do artista.
Quando confrontados, costumam acusar seus críticos de pertencerem ao primeiro grupo.

Por fim, temos o terceiro grupo — que, com um gesto de boa vontade para com a comunidade, vou considerar que exista e, sem falsa modéstia, me incluo nele.
São pessoas que amam Michael e o apoiam incondicionalmente, mas que não por isso deixam de ter senso crítico.
São fãs que reconhecem quando algo não lhes agrada e, ocasionalmente, expressam opiniões desfavoráveis — sem que isso diminua sua admiração e respeito.


Minha motivação ao fazer essa classificação é observar como o segundo grupo se deliciou com o documentário Living With Michael Jackson.

Haters disfarçados de fãs tomaram conta dos fóruns, questionando a sanidade de Michael e sua capacidade de gerenciar a própria carreira.
Tudo isso porque, para a alegria da mídia, Michael admitiu que já havia dividido o quarto com crianças.

Segundo esses “especialistas” — autoproclamados empresários de Michael —, ele jamais deveria ter dado tal munição aos seus detratores.

Mas é impossível não notar a ingenuidade (para ser educada) de quem sustenta esse tipo de opinião.


Em primeiro lugar, quem primeiro mencionou o fato de dividir o quarto foi o próprio garoto Gavin, que se recuperava de um câncer com a ajuda de Michael e era hóspede frequente em Neverland.

O jornalista Martin Bashir — com sua habitual falta de ética — se aproveitou da situação para fazer com que Michael admitisse publicamente que já tivera esse tipo de convívio com crianças, chegando a mencionar que dividira a cama em algumas ocasiões.

Como, realisticamente, Michael poderia negar?

Havia o risco de ser desmentido por testemunhas — como as próprias crianças, funcionários ou pessoas próximas.
Uma mentira flagrante seria lida como um reconhecimento implícito de que havia algo errado.

Além disso, durante as acusações de 1993, já era de conhecimento público que Michael dividia a cama com crianças.
Ele mesmo admitiu isso na época.

Negar agora que isso ainda acontecia soaria como uma declaração de arrependimento, sugerindo que só hoje ele reconheceria que aquilo era errado.

Por isso, ao afirmar que divide o quarto quando as crianças pedem, com consentimento dos pais, e ao explicar que vê a situação de forma inocente, Michael foi apenas coerente com suas declarações passadas.


Há também aqueles que compreendem esses argumentos, mas preferem condenar o comportamento em si — não as declarações.

Essa, sem dúvida, é a postura mais lamentável.

É uma inversão de valores: ao invés de exigir da sociedade menos preconceito, exige-se de Michael que molde sua vida aos preconceitos sociais.

Esses preconceitos, é verdade, não surgem do nada.

Os episódios recentes apenas confirmam que vivemos em uma sociedade onde a pedofilia é tratada como uma epidemia oculta — reflexo de um ambiente que não sabe lidar com a sexualidade dos adultos e que erotiza a infância de maneira insidiosa.


O fato de que um homem queira se relacionar de maneira afetiva e não sexualizada com crianças soa incompreensível para muitos, porque nossa sociedade só consegue imaginar uma intenção sexual por trás de tal convivência.

E é justamente aqui que Michael Jackson expõe a doença social em que estamos imersos.

Enquanto a sociedade vê tudo por lentes distorcidas, Michael tem algo do que se orgulhar:
Ele não faz parte dessa doença coletiva.


[*] Este texto foi adaptado para refletir os valores e diretrizes atuais, com o objetivo de preservar sua relevância e respeito ao público contemporâneo.