Era para ser o voo final, o grande adeus. No último ato de This Is It, Michael Jackson planejava sua saída triunfal do palco não com um simples aceno, mas embarcando em um avião batizado de MJ Air, que surgiria magicamente diante da multidão extasiada. Ele receberia uma maleta no centro do palco, vestiria uma jaqueta cinza metálica, retiraria o microfone e, num gesto quase sagrado, enxugaria o suor do rosto com uma toalha — a mesma que tantas vezes lhe fora entregue nos bastidores. Em seguida, daria uma última volta pelo público, subiria na aeronave e desapareceria como só ele sabia desaparecer: como um mito, entre aplausos e assombro.
Mas esse voo nunca aconteceu.
Na madrugada de 25 de junho de 2009, horas antes do mundo parar, os ensaios se estendiam até a uma da manhã. Michael estava exausto, sentado em sua cadeira de diretor, a silhueta frágil e silenciosa contrastando com o titã que brilhava no palco. Michael Bush, seu estilista de longa data e confidente silencioso, se aproximou com a toalha habitual. Entre eles, não eram necessárias palavras. O gesto de secar o rosto, de ajudar a tirar a camisa encharcada, era um ritual íntimo, quase paterno. Um vínculo forjado entre agulhas, tecidos e a confiança que poucos tiveram o privilégio de receber.
Era a quarta turnê juntos. Quatro capítulos de uma jornada que transformara Bush de simples costureiro a guardião de memórias. Em meio ao cansaço e ao suor, Bush agradeceu. “Você mudou minha vida de novo.” E talvez esperasse apenas um sorriso de volta. Mas Michael, respondeu com algo que jamais sairia da memória: “Não, Bush, você mudou minha vida. Obrigado.” Um agradecimento inesperado, que ressoava mais como despedida do que como rotina.
Aquele foi o último abraço. A última toalha entregue. Os sapatos que Bush levou com ele naquela noite viraram relíquia. E o carro que levou Michael embora na madrugada seguinte partiu carregando um futuro que nunca se concretizaria. O avião MJ Air nunca decolou, mas em espírito, naquela noite, algo já havia voado. A alma de um artista que ensaiava não apenas um show, mas sua saída definitiva.
A canção final seria Man in the Mirror, como profetizado. O homem no espelho que tentou mudar o mundo, e que mudou milhões. Mas o reflexo de Michael naquela noite já trazia sinais de adeus. Havia um silêncio entre ele e Bush que dizia mais que qualquer letra. Era um silêncio de missão cumprida. De alguém que, no íntimo, talvez soubesse que já havia dado tudo — e mais um pouco.
Hoje, quando revisitamos This Is It, não assistimos apenas a um espetáculo interrompido. Vemos um plano meticulosamente desenhado por um artista que queria sair voando, como um anjo urbano com jaqueta metálica. O palco era seu céu. E embora o MJ Air jamais tenha levantado voo, o mundo inteiro viu Michael partir — elevado por sua própria lenda.