Algumas músicas nascem antes de seu tempo. What More Can I Give, de Michael Jackson, foi escrita em 1992, como resposta aos distúrbios de Los Angeles após o caso Rodney King. Chamava-se provisoriamente Heal L.A., como um eco de Heal the World. Mas a ideia ficou guardada, amadurecendo em silêncio, até 1999, quando Jackson conversou com Nelson Mandela sobre generosidade. Daquele encontro surgiu a frase que se transformaria em refrão: “What more can I give?”. Não era apenas o título de uma canção, mas uma pergunta que desafiava a própria condição humana.
A tragédia do 11 de setembro de 2001 deu finalmente um propósito àquela música. Em 16 de setembro, apenas cinco dias depois dos ataques, Michael anunciou ao mundo que reuniria um coro de estrelas para gravar a faixa beneficente. Falava com urgência: “É hora de começarmos o processo de cura imediatamente”. Era o artista recusando a passividade, insistindo na crença de que a música podia ser bálsamo para um planeta em luto.
O anúncio foi seguido de uma mobilização impressionante. Britney Spears, Justin Timberlake, Beyoncé com o Destiny’s Child, Mariah Carey, Celine Dion, Ricky Martin, Shakira e muitos outros se uniram à causa. Mais do que uma superprodução musical, tratava-se de um gesto de comunhão: vozes diferentes para cantar um mesmo refrão de solidariedade. E porque a dor não tinha fronteiras, surgiu também a versão em espanhol, Todo Para Ti, com grandes nomes da música latina. A ambição era clara: transformar o luto em unidade global.
O momento culminante veio no dia 21 de outubro, no estádio RFK em Washington. Michael, vestindo uma jaqueta prata, subiu ao palco diante de 54 mil pessoas no concerto United We Stand. Ao lado de outros artistas, apresentou pela primeira vez What More Can I Give. Não importou que, mais tarde, a transmissão televisiva tenha cortado a performance: para quem esteve ali, o hino inédito já havia cumprido seu destino simbólico.
Naquele instante, a pergunta lançada por Michael ressoava além da melodia: o que mais podemos dar uns aos outros quando o mundo parece desabar? Talvez What More Can I Give não tenha tido o destino que se esperava nos meses seguintes. Mas, no coração de um planeta ferido, foi a lembrança de que a arte ainda pode convocar à generosidade.




