Pijama de bichinhos: O que os empregados viram na intimidade de Jackson | MJ Beats
Pijama de bichinhos: O que os empregados viram na intimidade de Jackson | reportagem 1993 MJ BEATS

Pijama de bichinhos: O que os empregados viram na intimidade de Jackson

por Virginie LeiteRevista Veja27 de outubro de 1993

Milhares de tietes venderiam a alma para esfregar o chão da suíte presidencial do hotel Sheraton Mofarrej no lugar da arrumadeira Gildete da Silva Santiago. No último dia 14, chamada para acabar com uma meleca de balas e refrigerantes espalhados no recinto, ela passava um pano úmido pela principal sala do apartamento 2201. Concentrada na tarefa, Gildete, 42 anos, tomou o maior susto de sua vida. Era ele! Depois de uma visita curta e tumultuada à fábrica de brinquedos Estrela, Michael Jackson resolveu voltar mais cedo. Foi aí que deu de cara com a arrumadeira.


Fiquei com tremedeira e uma vontade louca de abraçá-lo”, lembra a funcionária, que recebeu do ídolo um sorriso de recordação. “Ele é uma gracinha, nem parece de verdade.”

Enquanto batalhões de admiradores mantinham um incansável plantão na porta do hotel, sonhando com um simples aceno da janela (um garoto mais ousado tentou invadir o prédio pela tubulação do ar e acabou preso no almoxarifado), os empregados do Mofarrej tiveram seus fugazes privilégios. Poucos dos 160 funcionários, é verdade, conseguiram ver o cantor de perto. Durante seus cinco dias de permanência em São Paulo, os seguranças montaram uma barreira intransponível na porta do elevador com acesso à suíte que ocupa todo o 22º andar. Lá, nos 750 metros quadrados, o equivalente a catorze quartos normais — são 2.900 dólares a diária —, Michael e as três crianças que o acompanham pelas viagens da turnê Dangerous bebiam refrigerantes, empanturravam-se de doces e brincavam dentro de cabaninha de camping, que ele mesmo mandou comprar.

Por causa dessa distância, quem chegou perto do hóspede inacessível faz questão de exibir o troféu. O mordomo Pedro de Biasi, 24 anos, circulava na semana passada com a foto tirada ao lado de Michael. “Levanta o moral aparecer com ele”, exultava o funcionário, um dos únicos a conseguir essa graça. Se não quis posar para muitas pessoas, ao menos o cantor deixou vários souvenires no Sheraton. Os objetos serão doados à Santa Casa da Misericórdia, que os deve leiloar em breve. Ele esqueceu na suíte — ou jogou fora — uma camiseta e um pé de meia usado. Deixou também uma toalha de mesa em que rabiscou um rosto, escreveu Heal the World (Cure o Mundo, em português), nome da música que encerra os shows, e assinou seu nome. O pintor catalão Salvador Dalí tinha igualmente o costume de desenhar em toalhas de bares e restaurantes. Às vezes a levava embora, às vezes a deixava lá mesmo como pagamento da conta. Michael Jackson presenteou a sua ao hotel, mas seus assessores acertaram as despesas na saída. Entre diárias e serviço de quarto, as setenta pessoas da sua comitiva desembolsaram mais de 100 mil dólares no caixa do Mofarrej.

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O mordomo Pedro de Biasi e seu troféu: ”Levanta o moral”

De acordo com Alan Duggan, diretor de vendas do hotel, o lucro não veio daí. Para grupos numerosos como o de Michael — a trupe ocupou sessenta dos 244 apartamentos disponíveis no cinco estrelas da Alameda Santos —, são habitualmente oferecidos descontos, que podem atingir 40% em relação às tarifas normais. Na suíte ocupada pelo megastar, já dormiram, entre outros, a cantora Tina Turner e o ex-presidente da União Soviética Mikhail Gorbachev. Trata-se de um complexo com três suítes, duas salas, um escritório e uma cozinha. Durante o ano, sua média de ocupação é de 50%, contra 75% do restante do Sheraton Mofarrej. Ali, a diária mais barata gira em torno de 300 dólares. “Hospedar gente do nível de Michael ajuda a divulgar nossos serviços e a qualidade do apartamento presidencial”, considera Alan.

Essa propaganda teve um preço. As telefonistas do hotel quase ficaram loucas com o número de trotes. A cada minuto, eram feitas até seis chamadas de fãs que imaginavam ser possível falar com ele. Muitos se identificavam com nomes de pessoas famosas. “Xuxa” ligou incontáveis vezes, assim como sua empresária “Marlene Mattos”. Um anunciou-se como assessor do presidente Itamar Franco. Outro imitou o vozeirão.

Do prefeito Paulo Maluf. Claro que os truques não funcionaram. Os quatro ramais instalados no apartamento 2201 estavam bloqueados. Duas linhas diretas, uma delas para fax, foram instaladas na suíte. A encarregada de telefonia Rose Santos, 33 anos, era uma das únicas pessoas com acesso ao número, de prefixo 253, que fazia soar o aparelho na cabeceira do cantor. Certa noite, a telefonista bilíngue não resistiu à tentação. Ligou para lá, dizendo ser uma fã. Conversaram durante dois minutos. “Ele tem uma voz infantil”, conta Rose, que tremia ao telefone. “É supersimpático, perguntou minha idade e se eu iria ao show.”

Houve quem chegasse mais perto ainda. Na noite de sábado, véspera do último show na cidade, a lavanderia do Sheraton recebeu um lote de roupas da suíte presidencial. Para Vera Helena Ferreira, 37 anos, uma das funcionárias do departamento, não havia dúvida da procedência daquelas sete camisetas, três pijamas, dois pares de meia e quatro cuecas. “É lógico que eram do Michael”, assegura. Para quem já cuidou das roupas de Julio Iglesias e Rod Stewart, entre outros, as peças de Michael não causaram frisson. “Eu esperava mais”, afirma Vera. “As cuecas brancas dele podiam ser mais novinhas.” Qual seria a cotação de um tesouro desses para um fã-clube?

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Michael Jackson rabiscou e autografou uma toalha no Mofarrej, assustou a arrumadeira Gildete, trancou o quarto com as chaves dentro e pediu socorro

A exemplo das roupas íntimas, certos hábitos do cantor decepcionaram quem esperava no mínimo uma bolha de isolamento dentro do quarto. Michael Jackson trouxe a São Paulo um cozinheiro particular, o italiano Sadhana Khalsa, mas não pedia nada do outro mundo no cardápio. Sua dieta básica era frango e batatas fritas, acompanhados de arroz japonês. Como qualquer ser humano, na noite do dia 16 descuidou-se e trancou o quarto com a chave dentro. A supervisora de andares Maria Ferreira de Oliveira, 46 anos, foi convocada para resolver o problema. Encontrou-o sem maquiagem e de cabelos presos. Vestia um singelo pijama azul-marinho, com estampa de bichinhos. “Fiquei trêmula, não sabia o que fazer”, diz Maria, que lembra ter escutado um thank you pelo seu trabalho. “Se eu falasse inglês, pediria um autógrafo naquela hora”, lamenta-se. Fica para a próxima.

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(Arquivo do acervo de Rodrigo Teaser)