Os seguranças de Michael Jackson, Bill Whitfield e Javon Beard, imaginam como o Rei do Pop reagiria a um álbum de remixes de faixas inéditas.
No estúdio, Michael Jackson era um perfeccionista, obcecado por cada detalhe de suas músicas antes de lançá-las ao público, e foi bem documentado durante sua vida que ele não gostava que sua gravadora remixasse ou mudasse suas músicas. Mas sempre que você está lidando com o legado de um grande artista, as coisas vão ficar complicadas. Tendo trabalhado como equipe de segurança pessoal do Sr. Jackson por dois anos e meio, passando dias e semanas do seu lado, indo de e para o estúdio de gravação e o ouvindo trabalhar em casa, nós sentimos que podemos oferecer alguma perspectiva única sobre como ele podia se sentir a respeito deste álbum e da polêmica que ele criou.
Nós estávamos com o Sr. Jackson durante o tempo em que ele trabalhou nos remixes para o 25º aniversário de Thriller. Esses remixes foram ideia da Sony, não dele. Nós o ouvíamos no telefone o tempo todo, discutindo com seu empresário sobre não querer fazê-los. Sempre que o assunto dos remixes vinha à tona, ele dizia, “Há algumas coisas que você nunca deve tocar.” Devemos tê-lo ouvido dizer isso uma dúzia de vezes. Ao que lhe dizia respeito, o álbum era perfeito. Você não volta para acrescentar batidas de hip-hip em Thriller. É um clássico, e você não toca nele. Mas a Sony disse a ele que ele tinha de fazer. Disseram-lhe que ele tinha de entrar no estúdio e fazer esses remixes para se renovar.
Nós começamos a levá-lo para o estúdio para trabalhar nas faixas por volta de fevereiro de 2007, e a partir dali o processo se arrastou para sempre. Naquele momento, o aniversário da data de lançamento seria dali há 10 meses, em novembro. O mês veio e se foi, e o álbum ainda não estava pronto. Ele adiava e adiava e os remixes levavam mais e mais tempo para serem terminados. Todo tipo de coisa havia sido planejado, especiais de TV, aparições — nada disso aconteceu. Ele não estava bem com isso. Em janeiro de 2008, Jackson estava vivendo no resort Palms em Las Vegas, usando o estúdio de gravação lá. Um de nós estava com ele no estúdio quase o dia inteiro enquanto ele trabalhava, tentando recuperar o atraso e terminar essas canções as quais ele era obrigado a fazer por contrato, mas que não queria fazer. Ele não ia ao estúdio com entusiasmo. Dava para notar isso. Quando o álbum saiu, houve toda essa campanha publicitária na mídia, mas dentro do seu campo quase não se notou nada. Ele nunca falou sobre isso como se fosse uma grande coisa. Nós ouvimos mais animação na voz dele falando sobre ir ao cinema do que jamais ouvimos ele falando sobre Thriller 25.
Então, sim, ele odiava remixes. Mas vimos um outro lado de Jackson, também. Houve uma noite, quando estávamos no Palms, ao mesmo tempo em que ele estava trabalhando nestes remixes para Thriller 25. Ele nos disse que queria ir à boate no andar de baixo. Ele não queria fazer uma aparição; ele só queria sair e observar as pessoas. Esta boate tinha um camarote VIP que dava para a multidão, então fizemos os arranjos necessários para que ele fosse lá. Estávamos na boate por talvez dois ou três minutos quando, de repente, o DJ começou a tocar uma de suas músicas; eles a remixaram junto com outras músicas. O Sr. Jackson balançava a cabeça com o som e disse, “Uou, eu não sabia que eles ainda tocavam as minhas músicas.”
Nós ficamos tipo, “O que?!” Dissemos a ele, “Senhor, eles continuam a tocar a sua música o tempo todo. Em bares, boates, em todo lugar.”
Ele disse, “Sério?”
Ele pareceu surpreso. Ele estava fora dos holofotes e havia sido atacado pelos tablóides por tanto tempo que ele realmente sentia que talvez o mundo tivesse seguido em frente, e que ele não era mais tão popular. E ele realmente ficou feliz em escutar suas canções na boate. Ele queria que sua música fosse lembrada. Outros artistas muitas vezes pediam permissão para usar um sample de suas canções. O advogado de Jackson ligava e dizia, “Diga a Michael que Kanye West quer usar um sample de tal música. Quanto ele quer cobrar?”
Nós retransmitíamos a mensagem para Jackson e ele dizia, “Nada. Diga-lhes que está tudo bem se forem apenas usá-la. Quanto mais se usar a minha música, isso significa que a minha música permanece viva.” Ele poderia ter cobrado uma fortuna, mas não o fez. Ele só queria que sua música estivesse no mundo. Ele queria ser uma inspiração, estar conectado a este geração jovem de artistas e produtores que seguiam os seus passos. Ele queria que eles construíssem em seu legado.
Jackson acreditava que algumas coisas nunca deveriam ser tocadas, mas ele também queria que sua música fosse usada e mantida viva. Então o que ele pensaria sobre Xscape? Honestamente, ele provavelmente teria apreciado alguns dos seus aspectos, e outros nem tanto. Se ele estivesse aqui e escutasse o álbum e ouvisse sequer uma nota errada, ele ficaria furioso. Ele ficaria obcecado por dias, sem parar até encontrar um modo de fazer ela soar direito. Mas se ele visse os jovens nas boates, dançando ao som de seu novo single Love Never Felt So Good? Isso teria enchido o seu coração com uma alegria que você não pode imaginar.
Escutar todos esses jovens produtores falando sobre sua genialidade no estúdio? Ter o álbum #1 em cerca de 50 países diferentes? Saber que ele ainda era o Rei do Pop? Isto era importante para ele também.
Os últimos anos de Michael Jackson tiveram um pesado tributo sobre ele. Ele foi caçado pelos paparazzi, atropelado pelos tabloides, assolado por problemas legais e financeiros. Que tenhamos presenciado, apenas duas coisas lhe trouxeram verdadeira felicidade durante esse tempo difícil: o amor de seus três filhos e a dedicação de seus fãs, as pessoas que nunca se esqueceram da música, enquanto a mídia estava obcecada apenas pelos escândalos e boatos. Os fãs podem nunca chegar a um acordo sobre se o Espólio de Jackson está fazendo a coisa certa ou não. Nós podemos nunca concordar sobre a melhor maneira de honrar o seu legado, e todos nós vamos fazer as nossas próprias escolhas sobre que álbuns comprar e que projetos apoiar. Mas nós todos podemos concordar em uma coisa que Michael Jackson teria querido: ele iria querer que nós mantivéssemos sua música viva — nas boates, nas pistas de dança, e em nossos corações.’
Traduzido por Bruno Couto Pórpora, 2014